quarta-feira, 16 de junho de 2010

Falta.

Anteriormente, num passado nem um pouco distante, algo foi embora. A lucidez, em sua forma material, que se desfez de diversos afazeres relacionados à minha pessoa. O primeiro problema - o que nos afastou - foi a falta do tempo. Ela não tem mais tempo pra nada, está sempre longe, fora de meu alcance; fora do espaço em que me envolve; fora do universo ao meu redor. Há muito tempo que não a vejo, nem de longe. Depois do tempo todo em que ficamos como metade que há de se encontrar, nos desencontramos, de uma hora para outra e sem explicação, como se não fizéssemos mais par. Sempre fomos um pelo outro... Éramos à vontade de tudo... Nos completávamos.



Agora: é como se eu estivesse a emergir; e minha lucidez agarrará em minha mão e nunca mais soltará, porque sempre, em algum ponto, precisarei dela mais do que tudo.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Pignatari.

Cr$isto é a solução.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Foudèr Fiction - Tempos de Criatividade

por Marina Albuquerque.


Quanto mais o elevador se aproxima do décimo sétimo andar de um dos edifícios mais luxuosos da cidade, percebo que o mundo de Fernando Foudèr é movido por apenas três sons: máquinas industriais, pessoas falando e gargalhando, e o batimento cardíaco de quem visita pela primeira vez sua "fábrica" de cultura e referências, a casadeGiz.
Assim que as portas de ferro do elevador se abrem, sou surpreendida por quatro pessoas nuas, estáticas, ocultando a campainha e a maçaneta de cada um dos dois apartamentos que compõe a casadeGiz. São jovens, bonitos, inexpressivos, que provavelmente acreditam que estão fazendo alguma coisa de útil. Para Fernando estão. De nada mais precisa se não a estética dos quatro modelos. Duas moças e dois rapazes. Elas, de seios grandes, enrijecidos, curvas perfeitas, cabelos amarrados para o alto, olhos lindos e frios. Eles, de físico atlético, maxilar quadrado, barba e olhar vazio. Todos com pelos pubianos compridos. Cada casal se apropria da entrada de cada apartamento. Me faz lembrar uma performance de Marina Abramovic. Com certeza, Fernando deve ter roubado a ideia de lá.
Depois do espanto, decido ir até a porta do apartamento 1115, onde ficam as salas, as exposições e o escritório de Foudèr. Fico encarando a moça, que está com a campainha no meio das pernas, para que fique constrangida. Não obtenho sucesso. Continua estática, olhando para o nada. Tenho que me abaixar para apertar a campainha e quase encosto no púbis dela. Aguardo. Tento não olhar para o pênis do rapaz e para os seios da moça, mas é quase impossível; ambos são grandes. Depois de dois minutos e quarenta e três segundos abrem a porta. Não consigo visualizar o anfitrião, pois o rapaz nu cobre a passagem. Só ouço uma voz feminina perguntar: "Quem gostaria?", e respondo: "Marina Albuquerque, do blog 'Coisa Nenhuma'". "O que deseja?" "Agendei uma entrevista com o Fernando Foudèr". "Quando?" "Na primeira semana do mês". "Pode entrar. Avisarei ele. Vá direto para o Salão Branco. Pode tirar milhares de fotos, só não encoste, derrube ou quebre nada, por favor." O único jeito de entrar no apartamento era passando pelo meio das pernas do rapaz, uma situação um tanto constrangedora, pelo fato de que rocei meus quadris nas coxas dele e a cabeça em sua genitália. Fechei a porta logo que entrei.
O saguão de entrada é estranho, assim como as pessoas que por ele desfilam e gargalham. É vazio. E em determinadas partes, nas paredes, forrado de plástico-bolha. E papel-filme. E Contact espelhado. Nada de obras de arte, performances, exposições, esculturas... Nada. Só pessoas sentadas e deitadas no chão, de aspecto hippie, umas se beijando, outras declamando poesia concreta, outras bebendo, outras lambendo uma cuíca, outras comendo frutas, enfim. Decepção, talvez fosse a palavra que resumiria toda a minha expectativa.
De repente surge em minha frente a personificação da voz que me atendeu. É uma jovem, com expressão soberba, feia, e um ar empobrecido. "Tiana", ela se apresentou. "Prazer". "Vá direto para o Salão Branco", disse com certa aspereza. Não hesitei e fui direto para lá. É a maior sala do terceiro corredor do apartamento. A porta é pintada de vermelho-fogo e a maçaneta e os contornos, de branco. O interior é claustrofobicamente branco também. Todo branco. Sofá branco, cadeiras brancas, mesa branca, paredes brancas, luz fosforescente branca, armário branco, tudo branco. Cada detalhe. Branco, branco, branco. O ar condicionado estava ligado e muito frio, o que só fazia aumentar o ar nórdico que pairava lá dentro. Os olhos ardem depois de alguns minutos. Me sentei no sofá branco de couro, um pouco distante da mesa onde provavelmente Foudèr se senta. E esperei. A cada três segundos um arrepio me estremecia. Encolhi os braços depois de retirar o gravador da bolsa e pô-lo ao meu lado. Observei as molduras brancas que são postas como quadros. Algumas são enormes. Outras, como se fossem uma sequência, são enfileiradas lado a lado. E aguardei por vinte e três minutos naquele quarto de manicômio até Fernando Foudèr chegar. A porta se fechou e de pés descalços foi até sua mesa. Sentou-se na cadeira de estofamento branco que ficava atrás. Me olhou e dei um sorriso. "Oi. Eu sou Marina Albuquerque, do blog 'Coisa Nenhuma'. Marcamos uma entrevista no começo do mês, lembra?" "Sim. Mas infelizmente hoje não vai dar. Estou indisposto. E exausto. Acabei de chegar de uma exposição desses lindos quadros brancos. Comprei todos eles e foram colocados agora. Não são lindos?"